Professora, vai ter prova?

Estamos em 2024 e ainda tenho provas para corrigir. Inovo sempre que posso nos exercícios, mas fatalmente, ninguém escapa das provas chamadas P1. É o cuidado da instituição com as provas no modelo ENADE. Coisas que fazem parte da nossa realidade. Passo pelas questões objetivas e entre “certos e errados” vou conferindo o gabarito. Não me atenho a ele e vou nas questões rabiscadas por caneta ou lápis. Vejo quem ficou entre duas e marcou a incorreta. Vejo os pontinhos da matéria anotados nas margens, num esforço pra que a memória, tantas vezes desafiada pelo TDAH de muitos. A última questão da minha prova quase nunca muda. Pergunto quais são os três pontos que aprenderam na disciplina (habilidades que desenvolveram, trabalhos marcantes) e o que MAIS gostariam de aprender dali pra frente. E conversamos ali por meio das entrelinhas. Descubro os que já fizeram outro curso antes, dessa vez, havia um que havia feito estatística. A que começou o estágio. A que se preocupa com questões de ética. Vi que ali, pelo menos para estudantes de semestres iniciais, eu ainda era só a NPB, iniciais de uma inteligência não muito artificial. Eles ainda abrem mão do texto perfeito e das consultas às IAs que tudo tem, estruturadinho, dividido em tópico, para escutar uma professora de carne, osso e ideias. Aquela que o conhecimento não remonta a 2021 mas a segundos atrás. Porque a professora deles é feita de agoras. Materializa-se naquele encontro que se faz entre cada inspiração e expiração. E isso vai ser difícil de a máquina emular. É nesse encontro que se dá a presença. Como disse Trevisol “como é grande nosso SER na presença e alguém”. Chegam ávidos e saem do encontro com uma dica, com um livro, com uma troca, tão bacana sempre pra ambos.
Nas avaliações de hoje, a última pergunta era sobre “agoras”, como eu falei. O que queriam aprender mais. Longe das telas por duas horas inteiras, munidos de papel e caneta, começaram a conectar ideias e impressões, e se derramaram em palavras. Quem disse que “aluno” não pensa, não escreve? Uns com aquele ardor de quem quer dar o próximo passo, outros pelo dever formal de responder a questão e dela ganhar os pontos. As inteligências de cada um e de cada uma, nada artificiais, tomaram o corpo e trouxeram muito de si.
Nas aulas seguintes voltaremos à loucura das telas, das interrupções, das imagens geradas por IA, mas em cada aula terá mais um pouco dessa turma. Um exemplo de marketing de influência aqui, um CONAR ali, uma pessoa para conversar com eles sobre o mercado de trabalho, uma visita a uma agência, um workshop criativo. Pesquisarei temas que não conheço e conhecerei mais ainda o universo deles.

Professores: pergunte e eles responderão. Não nos escondamos na prepotência (ou talvez na defesa) de querermos saber tudo e dar conta de tudo sozinhos. Não precisamos ser a fonte de todas as respostas. Haverá sempre algum que viu, que ouviu, que sabe de alguém que sabe.

A tentação dos tempos digitais nos instiga a “ganhar tempo” deixando para as máquinas as tarefas que estes próprios tempos julgam mecânica. Mas quando você tem avaliações e trabalhos nas mãos, mais do que a memorização, você tem a criatividade, a inteligência, um pouquinho de um ser materializado diante de ti. É o feedback, sempre tão precioso para a comunicação, bem ali diante de seus olhos. E ele corporifica a COMUNICAÇÃO, sexta etapa do nosso processo criativo.
Com paciência e atenção aos detalhes, descobriremos juntos que, se houver disposição para deixar o passado de lado, tudo o que sabíamos fazer até ontem, haverá criatividade e dicas valiosas nessas linhas e entrelinhas. Bendito sejam vocês, estudantes “calouros” que, a cada semestre, renovam a minha fé.

 

CRÉDITO: IMAGENS FREEPIK

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Respostas de 2

  1. Muito reflexivo. Deliciosamente reflexivo. Que cada vez mais possamos ter professores assim: “de carne, osso e ideias”. Porque é na troca das ideias e diante de tanta dedicação que a mediação e conhecimento acontecem. Muito bom. Muito bom de ler e saber do cuidado que professores fantásticos como Nivea tem e fazem a diferença.

    1. Gratidão pelo seu carinho e por sua partilha. Você também é uma professora de “carne, osso e ideias”, sempre colocadas em prática com muito sucesso. É nesse fazer diário que visita e revisita os lugares do aprendizado que vamos evoluindo juntos.

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